Entrevista com Ângelo Costa
Fizemos
uma entrevista com o ilustre sociólogo Ângelo , formado
em psicologia e sociologia pela UFRGS (Universidade Federal do
Rio Grande do Sul), com doutorado em lingüística e
comunicação pela Harward University.
1-) Ângelo, você como um sociólogo
deve saber que há um mito no Brasil sobre a unidade da
língua, como se todas as pessoas falassem de uma mesma
maneira.Fale um pouco sobre este assunto.
Pois bem, às vezes, como sociólogo, esqueço
dessa discussão porque nós,sociólogos já
temos clara a concepção de que as pessoas não
falam da mesma maneira, nem aqui nem na China... Desculpem a piada
interna. Aliás, menina, você como jornalista devia
ter isso muito claro.... Enfim... Essa é uma concepção
antiquada, medieval, digo mais, faraônica. Esse mito funciona
mais ou menos assim: quando você pensa num país como
a Espanha, que possui duzentos mil tipos de dialetos, onde as
pessoas de diferentes cidades mal se entendem, é natural
ver com espanto o caso do Brasil, com seu tamanho colossal etc
e tal. Mas, apesar de nos entendermos, há algo de podre
no que diz respeito à nossa língua. A língua
ensinada na escola, ou seja, aquilo que se espera que saia da
boca da ancora do Jornal Nacional, não é o mesmo
que se fala na rua. E não é essa língua que
se fala na rua que constitui o português? Eu gostaria que
fosse, Mas Não É! Paradoxalmente não é!
O português, para a maioria das pessoas, políticas
publicas que regulam o ensino e até para pessoas como você,
que insistem em me fazer perguntas desse tipo, é constituído
pelas regras da gramática normativa, ou seja, o português
é aquela coisa que ninguém fala, a não ser
aqueles chatos dos programas de português. Aliás,
nem por eles!
2-) E quanto ao mito de que no estado do Maranhão se
fala melhor o português? O que você diz? Você
acredita que existe algum lugar do Brasil onde se fala melhor
o português?
Maranhão? Eu nunca fui ao Maranhão. Ouve-se tão
pouco sobre o Maranhão que não me espantaria se
a existência do estado fosse mítica também!
Mas vamos aos fatos...Se falar melhor o português vai de
encontro com a posição do senso comum, como expus
ali em cima, creio que o melhor lugar deva ser a casa do Sarney,
ou qualquer outro desses velhotes da ABL, e o Sarney é
do Rio Grande do Norte, Alagoas.. Não sei! Perceba, nada
tem a ver com o Maranhão. Tirando isso, a norma culta como
representativa do português como língua, não
existe lugar onde se fala melhor ou pior. A noção
de língua deixou de estar vinculada à de norma culta
há muito tempo; trabalhamos agora num nível abaixo
desse, onde língua também é o que se fala
no morro, por exemplo. E quando se trata do assunto em comunicação,
o conceito é ainda mais frouxo!
3-) Com relação ao português de Portugal,
por ser a raiz da língua e da gramática portuguesa,
você acredita que ele é melhor falado em Portugal?
Chega de Gramática! Não me venha com esses termos
que tenho tremores! Perceba, Portugal pode sim ser nosso berço
lingüístico, mas nem por isso se fala melhor lá
ou aqui, ou qualquer outra coisa. Pensei que já havia encerrado
esse assunto com minhas outras elucidações! Compreenda,
essa concepção está muito ligada aqueles
cidadãos do séc XIX que, de certa forma, achavam
que a escrita daqui deveria se aproximar da escrita de Portugal,
talvez pelo estatuto (superior) que a literatura portuguesa possuía
na época. Mas, há tempos, se desvinculou, nos estudos
acadêmicos, a língua falada da língua escrita;
e há muito Portugal deixou de ser moda. Cá entre
nós que anda mais em baixa que o Maranhão. Agora,
pela última vez: esse tipo de concepção vai
de encontro com aquela que crê na norma culta como sendo
a "noção de língua", esquecendo-se
que ela é um construto socialmente produzido. A gramática
não existe fora do papel, as pessoas, até mesmo
os gramáticos, se comunicam com um português chulo.
Nesse sentido, a língua é aquela que é falada
na rua, e não a usada por meia dúzia de letrados.
Esse seu problema a respeito da língua é um problema
conceitual; leia mais que você descobre a verdade...
Abraços
Angelo